Cristiane Sampaio
PREVIDÊNCIA CAPITALIZADA: “A GANÂNCIA DOS BANQUEIROS QUE MATA APOSENTADOS”
Brasil de Fato | Sã;o Paulo (SP)
20 de Març;o de 2019 à;s 17:02
Cristiane Sampaio
Brasil de Fato | Sã;o Paulo (SP)
20 de Març;o de 2019 à;s 17:02
No perí;odo entre 1981 e 2014, 30 paí;ses de diferentes continentes privatizaram, de forma total ou parcial, seus regimes de Previdê;ncia social obrigató;rios. Os resultados desse processo fizeram com que, até; o ano passado, 18 deles voltassem atrá;s, buscando reverter, també;m de forma total ou parcial, as reformas implantadas. O dado foi publicado no estudo “Reversã;o da privatizaç;ã;o de Previdê;ncia: questõ;es-chave”, lanç;ado pela Organizaç;ã;o Internacional do Trabalho (OIT) em dezembro de 2018.
Compõ;em a estatí;stica paí;ses do Leste Europeu e da antiga Uniã;o Sovié;tica, da Á;frica e ainda 14 paí;ses da Amé;rica Latina, como Venezuela, Argentina, Chile e Colô;mbia.
:: “;O objetivo da reforma da Previdê;ncia de Bolsonaro é; entregá;-la aos bancos”; ::
Embora os defensores das reformas apresentem ;a privatizaç;ã;o dos sistemas de aposentadorias e pensõ;es como soluç;ã;o para lidar com os desafios demográ;ficos – como, por exemplo, o envelhecimento da populaç;ã;o – e para a sustentabilidade da Previdê;ncia, a OIT afirma que tais paí;ses acumularam, ao longo do tempo, evidê;ncias que demonstram “que o experimento da privatizaç;ã;o fracassou”.
Uma delas é; o fato de as mudanç;as terem beneficiado o setor financeiro em detrimento do desenvolvimento nacional. O estudo aponta que, nesses paí;ses, em geral, o uso de fundos de previdê;ncia para investimento pú;blico “se perdeu nos sistemas privatizados de capitalizaç;ã;o, que investiram as poupanç;as individuais em mercados de capitais buscando retornos elevados, sem colocar as metas nacionais de desenvolvimento como prioridade”.
:: ;Por que os chilenos lutam contra o modelo de previdê;ncia que Bolsonaro quer copiar ::
A auditora fiscal Maria Lucia Fatorelli, uma das maiores especialistas do Brasil em Previdê;ncia social e coordenadora nacional do movimento Auditoria Cidadã; da Dí;vida, afirma que o diagnó;stico levantado pela OIT chama a atenç;ã;o para a ló;gica que fundamenta os sistemas de capitalizaç;ã;o e a operaç;ã;o do mercado financeiro .
“Essa modalidade de capitalizaç;ã;o está; se mostrando excelente somente para os bancos que administram os fundos, porque eles cobram taxas exorbitantes. A pessoa que coloca lá; R$ 1 mil ;nã;o vai ter R$ 1 mil na conta. Esse valor vai ser investido. Se a aplicaç;ã;o der errado, esses R$ 1 mil podem virar R$ 500 ou até; R$ 0. ;Mas, mesmo que vire R$ 0, essa pessoa da conta individual vai ter que pagar a taxa de administraç;ã;o para a instituiç;ã;o financeira que administra esse conjunto de contas. ;Entã;o, é; uma perda brutal pra classe trabalhadora e o ú;nico setor que ganha é; o setor financeiro”, explica Fatorelli.
Por conta desse modelo adotado por paí;ses que implantaram reformas previdenciá;rias de cará;ter privatizante, a OIT aponta que houve uma concentraç;ã;o no setor de seguros privados. O organismo afirma que os defensores das mudanç;as argumentaram que a reforma geraria competiç;ã;o entre os diferentes administradores privados e que, na ponta, isso favoreceria o trabalhador, com melhorias na eficiê;ncia do sistema e na prestaç;ã;o de serviç;os.
Os resultados observados nesses paí;ses, no entanto, caminharam no sentido oposto: o estudo da OIT observa que, no Chile, por exemplo, o nú;mero de administradores de fundos privados de previdê;ncia caiu de 21, em 1994, para cinco no ano de 2008. Diante desse cená;rio, as trê;s maiores empresas do setor passaram a deter 86% dos ativos do mercado, o que impediu que houvesse benefí;cios resultantes da concorrê;ncia.
“Pressã;o fiscal”
Outro aspecto levantado pelo organismo diz respeito aos altos custos de transiç;ã;o, que, segundo o estudo, foram “subestimados” pelos paí;ses e criaram “pressõ;es fiscais” sobre a má;quina pú;blica.
Na Bolí;via, por exemplo, os custos reais foram 2,5 vezes maiores que a projeç;ã;o traç;ada pelos defensores da reforma. Já; na Argentina, a previsã;o inicial de gasto, que seria de 0,2% do PIB nacional em 1994, aumentou 18 vezes, consumindo 3,6% do PIB. Com isso, os governos mergulharam numa crise fiscal porque tiveram que canalizar aportes de recursos para os fundos previdenciá;rios.
“Houve um estrangulamento do orç;amento, e nã;o só; isso: as pessoas que migraram pro regime de capitalizaç;ã;o pararam de contribuir com a Previdê;ncia social. Ela para de contribuir para o regime geral e a arrecadaç;ã;o dessa contribuiç;ã;o – tanto dela quanto do empregador – para de chegar aos cofres pú;blicos. Entã;o, é; uma dupla pressã;o orç;amentá;ria”, explica Fatorelli. ; ;
Alerta ao Brasil
Para a coordenadora da Auditoria Cidadã; da Dí;vida, a pesquisa da OIT serve de a ao Brasil, que discute atualmente a Proposta de Emenda Constitucional Nº; 6/2019, do governo de Jair Bolsonaro (PSL).
A medida propõ;e uma reforma da Previdê;ncia e traz, em seu conteú;do, o modelo de capitalizaç;ã;o, baseado na adoç;ã;o de contas individuais para o regime previdenciá;rio brasileiro. O sistema rompe com a ló;gica coletiva de financiamento, em que trabalhadores, empresas e Uniã;o tê;m participaç;ã;o nos aportes.
Fatorelli sublinha que a proposta coloca em xeque o principal objetivo do trabalhador, que é; a seguranç;a no futuro nã;o só; para a aposentadoria, mas també;m para as situaç;õ;es de risco social, como sã;o os casos de cobertura previdenciá;ria para situaç;õ;es de doenç;as, invalidez, pensõ;es por morte, etc. ;
“Em todos esses eventos, a gente [trabalhador] quer o quê;? Proteç;ã;o, seguranç;a. A capitalizaç;ã;o é; uma conta individual, é; cada um por si, e o dinheiro é; aplicado em aplicaç;õ;es de risco. Qual é; a ló;gica de colocarmos a nossa Previdê;ncia, a nossa seguranç;a, ligada aos momentos em que estaremos mais vulnerá;veis, que sã;o todos esses eventos, em aplicaç;ã;o de risco? A coisa nã;o tem nem ló;gica semâ;ntica”, critica. ;
Ediç;ã;o: Daniel Giovanaz
Fonte: BRASIL DE FATO